quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Sobre a participação dos cidadãos e a utilização de tecnologias na democracia

"Voting Technology, Political Responsiveness, and Infant Health: Evidence from Brazil" é o título de um artigo da autoria de Thomas Fujiwara, que demonstra que a introdução do voto electrónico no Brasil – de forma faseada entre 1994 e 2002 – contribuiu para a diminuição dos votos nulos - decorrentes da iliteracia da população -, aumentando o poder de voto dos eleitores mais carenciados e, em consequência disso, para a eleição de candidatos de nível socioeconómico mais baixo; o que acabaria por ter influência na adopção de políticas de protecção social ao nível da saúde pública (nomeadamente ao nível da saúde pré-natal e dos recém-nascidos).

No Brasil, as eleições para as Assembleias Legislativas são feitas através de listas abertas, votando os cidadãos nos candidatos e não nos partidos. A votação, até aí, era feita através do preenchimento de um boletim de voto onde cada cidadão introduzia o nome ou o número de candidato em que pretendiam votar. Este método levava a percentagens elevadas de votos nulos, sobretudo - como se compreende - por parte dos eleitores com menor instrução.
A adopção do voto electrónico – que permite, por exemplo, mostrar uma foto do candidato correspondente ao número introduzido pelo eleitor, e dar-lhe a opção de confirmar ou reverter a introdução feita -, juntamente com uma campanha levada a cabo pelo Governo Federal para ajudar as pessoas a usar o novo método, contribuíram – diz o estudo – para uma redução dos votos nulos e para a eleição de deputados de níveis socioeconómicos mais baixos.
Segundo Fujiwara, estas alterações ao nível dos resultados eleitorais resultaram num maior investimento em matéria de saúde pública, no aumento da proporção de grávidas com acesso a cuidados de saúde pré-natais e à diminuição da prevalência de nascimentos de crianças com peso considerado baixo. A escolha destes três indicadores prendeu-se com três razões: (i) a saúde pública – sobretudo a saúde pré-natal – é um campo político com visibilidade e que os legisladores podem influenciar num curto período de tempo; (ii) as mulheres grávidas carecem mais de apoio médico e beneficiam mais de um acréscimo nesse apoio; (iii) a saúde dos recém-nascidos revela mais rapidamente a melhoria das condições de saúde do que as dos adultos (em que os resultados aparecem ao longo do tempo).
Através deste estudo, Fujiwara demonstrou que, em última instância, a adopção de uma tecnologia que permitiu uma participação mas efectiva da população a nível político, se reflectiu, num espaço de tempo relativamente curto, na melhoria das condições de saúde da população.
Quanto a mim, estão aqui em causa duas ideias:
1. Que as novas tecnologias podem, de facto, ser um aliado importante para efectivação da democracia;
2. Que a participação consciente da população (mesmo que, como neste caso, apenas através do voto) pode, contra muito cepticismo, influenciar as condições de vida dessa mesma população.
Embora os efeitos registados possam ser dependentes do contexto brasileiro – o facto de as votações serem através de lista aberta têm nisso enorme influência -, o estudo demonstra que a eliminação de um obstáculo simples pode ter resultados substanciais nas políticas públicas.
 
autor: Bruno Leal

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