Platão - extracto de "Escola de Atenas" |
No entanto, à época de Platão discutia-se abertamente qual o melhor modo de governo. Na sua obra “República” ( ou “Politeia”) para além do aprofundar da discussão em torno do conceito de “Bem” e se realmente compensa fazer o dito “Bem”, Platão também tenta definir, através da dialéctica, qual o melhor Sistema Governativo – numa relação com o próprio tema do “Bem”. Para Platão o melhor Sistema de Governo seria a Aristocracia – o "governo dos melhores”, segundo a definição do próprio - em oposição a todos os demais, especialmente à democracia da época que o filosofo tão bem conhecia. Mas porquê esta opção? Platão justifica-se pelo melhor interesse que a forma de governo “aristocrática” teria para a Polis – a sociedade -, porque a democracia, embora melhor idealmente pela igualdade e liberdade que promovia, podia trazer malefícios sociais, não garantindo que os mais competentes efectivamente governassem. Platão defendia assim o “governo dos melhores” – a aristocracia –, mas não na forma hereditária que conhecemos associada às monarquias dos últimos séculos. Defendia uma revolução social em que se pudesse despoletar e desenvolver o melhor de cada cidadão, e pelas qualidades e méritos indivíduos nas suas várias vertentes, atribuir-lhes papeis e responsabilidades na sociedade, ficando efectivamente o governo, a mais alta posição social, destinada aos mais capazes. Plantão propunha uma sociedade que conseguisse designar os melhores para cada cargo. Esta concepção tem tanto de ideal como de utópica, Para além disso, mão há dúvida que o conceito de “Governo dos melhores” pode ser chauvinista, discriminatório negativamente, e atentar contra os ideais de liberdade e igualdade, mas, ao fim de contas, não será o processo democrático, nas suas várias formas, um modo de tentar encontrar os melhores governantes dentre todos os cidadãos?
A sobrevivência dos mais aptos (1880) - Georges du Maurier |
Mas, com o advento da Internet, e recentemente das Redes Sociais - a Internet 2.0 -, o modo de concretizar a cidadania e até o da própria representação e governação política pode vir a ser profundamente alterado. Pode-se dizer que estamos a viver uma mudança de paradigma político.
Actualmente o nosso sistema de representação política depende da dificuldade de cada cidadão se representar a si próprio politicamente. Sendo a concretização do "governo do povo" – significado de Democracia – feito de forma parcial e indirecto. Caindo ou sendo diminuídas essas dificuldades mudará o paradigma político. Isso será difícil, se não impossível, de conseguir, mas se porventura algum dia os cidadãos se conseguirem representar a eles próprios, em todos os actos de governo, teremos então uma verdadeira e completa democracia, uma democracia mais directa.
A visão de Platão e do seu governo ideal, coadjuvada pela tecnologia, poderá ser reinventada e reinterpretada à luz do socialismo democrático: democrático pois os mais aptos – “os melhores” - poderiam ser escolhidos de entre uma série de cidadãos qualificados e com competências e características para determinadas funções; socialismo na medida em que tendo cada cidadão a função ou papel que melhor se lhe adequa, de acordo com as suas características naturais e as que vai ganhando ao longo da vida, haveria um benefício para toda a comunidade, especialmente através de grupos de cooperação capazes de ser renovados. Isto seria uma concretização em prol do Bem comum, optimizando-se a sociedade no sentido dos seus membros assumirem cargos e funções que mais beneficiassem todo o grupo. Já para não falar do potencial de realização pessoal dos indivíduos/cidadãos.
Conseguindo implementar verdadeiramente uma sociedade onde a igualdade de oportunidades universal fosse uma realidade, especialmente no desenvolvimento das qualidades e potencialidades dos cidadãos, poder-se-iam reduzir dúvidas e facilitar o revelar dos "melhores". Os governos poderiam existir em várias formas, por exemplo, poderiam organizar-se num modo evoluído de fóruns ou redes sociais do futuro, podendo assim todos os cidadãos, ou uma grande maioria deles, através de tecnologias de informação avançadas, participar e interagir, provar qualidades e demonstrar, apresentar e confrontar ideias relacionadas com os assuntos da governação. As barreiras e distâncias não seriam impedimentos e poderiam ser organizados governos temáticos. A governação poderia ser feita a todos os níveis - local, regional ou nacional - ou simplesmente por áreas específicas e de interesse.
Então podemos avançar, tendo em conta o significado de aristocracia platónica e a capacidade, através da tecnologia, de cada cidadão se representar a si próprio, um novo tipo de democracia: a “Aristocracia-Democrática”, ou acrescentado "neo" se necessário. Sistema que poderia ser um possível caminho para o Socialismo Democrático, mas somente se se conseguisse garantir que o reconhecimento dos mais aptos para cada papel não deixasse qualquer dúvida e fosse dada igualdade de oportunidades a todos os cidadãos, segundo o ideal de que o potencial de cada cidadão depende do próprio indivíduo e das oportunidades que lhe são dadas pela própria sociedade e meio social onde se desenvolve.
Conjecturas e utopias filosóficas à parte, a realidade actual exige, porventura, soluções mais plausíveis. De qualquer modo, até a ideia, aparentemente, mais improvável e criticável pode contribuir para relançar do debate sobre a necessidade de reinventar o socialismo democrático, e dele ser a via para responder às necessidades de hoje e do futuro.
autor: Micael da Silva e Sousa
Creio que este conceito de aristocracia é provocatório, o q é excelente. O platonismo e aristocracia são frequentemente associados à negação da democracia.
ResponderEliminarNão explicaste como é que os tais fóruns e redes sociais escolheriam os melhores. Afinal é democracia directa ou escolha dos melhores para governar? E porque é que os fóruns seriam os excelentes meios para escolher os melhores?
Afinal existem milhares de experiências de democracia mais directa nos nossos dias (agenda local 21, orçamento participativo, sondagens deliberativas, etc.). São estes os tais fóruns?
Claro q num texto tão curto muita coisa tem de ficar de fora. Vamos lá a ver se o tom ideologicamente provocatório do texto suscita alguma reacção. Duvido, pois gostamos é de meter as coisas em gavetas para não pensarmos nelas. Este é logo metido na gaveta dos delírios, o q é uma pena, pois a grande questão q se coloca aqui é a relação entre saber e governação. Desde o famoso texto de Downs, de 1957, aplicando os métodos económicos à análise da política (antecedendo a escola da public choice) que sabemos q este é o ponto fraco do sistema político. Infelizmente este debate continua arredado da agenda. É deste tipo de brainstorming que nasce a verdadeira compreensão da realidade e das possibilidades do futuro.
Em suma, excelente.
Abraço
zé nuno lacerda fonseca
Escrever este texto foi teclar na "corda bamba". Confesso que senti o risco e por vezes fiquei na dúvida de como apresentar todo este rol de novas e velhas ideias. Mas foi propositada a intenção de deixar deliberadamente duas leituras distintas e duas portas de saída para este salto no desconhecido: a via em que cada cidadãos se pudesse representar a si próprio e participar na dita governação através de fóruns, possíveis através das novas tecnologias; e a capacidade de, numa sociedade onde impere uma verdadeira igualdade de oportunidades, escolher e atribuir as funções e papeis sociais a quem tiver mais apto para os desempenhar.
ResponderEliminarApesar de poderem ser visões distintas e incompatíveis penso que também o contrário pode ser verdade, até porque isto terá tantas alterações pela inevitável alteração do paradigma político, panorama que o próprio futuro nos impede de ver com clareza pela sua volatilidade e imprevisibilidade. Aliás, nada de espantar, não consta que ninguém tenha verdadeiramente dotes de vidência. É como diz José Nuno, isto é verdadeiramente um acto de "brainstorming" ideológico.
Voltando à compatibilidade que me parece possível destes estes supostos antagonismos. Os fóruns permitiriam uma igualdade de oportunidades no que toca à participação na "coisa pública", permitiriam que os cidadãos se envolvessem, debatessem e interviessem sobre os assuntos públicos e tudo o que possa ser assunto político. Aí, os mais competentes, mais empenhados, mais pró-activos e os que apresentassem mais ideias e projectos concretizáveis e geradores de consensos, pelo seu próprio valor, poderiam efectivamente sobressair. No fundo, seria um modo de todos [os cidadãos]terem iguais oportunidades enquanto indivíduos e de coordenarem esforços em prol de ideias e projectos concretos pelo valor e qualidade das próprias causas em prol do bem comum. No fundo, seria a escolha "dos melhores" via "democracia" para objectivos "colectivos".
Digo isto especulando pois trata-se efectivamente de fututologia e até de alguma utopia, mas talvez destas conjecturas possa efectivamente sair algo de proveitoso.
O Homem só Existe e faz sentido, recriando-se em cada momento...ad infinito!
ResponderEliminar...A "reflexão" é, como todas as intelectualmente honestas, pertinente! Todavia levanta sérios problemas...lembre-mo-nos de Walter Benjamin e de Theodor Adorno, da "intoxicação de informação" dos meios de comunicação social...
É, concordo, necessário encontrar um novo paradigma, que permita mais justiça e uma verdadeira ética, mas tal desidrato passará, penso eu, pelo esforço de educação e formação "cívica" da população! Relembremos S. Tomas More e a sua obra "didáctica": Utopia!
Parabéns e bem haja por pensar e repensar a "arquitectura da sociedade", sem o trabalho do percurso "reflexivo" é impossível, ou mais improvável, evoluir no sentido da dignificação do ser humano!
Manuel José Flores de Carvalho
Platão foi o maior socialista da historia,bem maior do que os pervertidos Marx, Engels, Lenin, Stalin e outros.A China e oVietnan marcham claramente para o projeto platonico e vão dar uma lição no muno demoralizndo o satanico Estado Oidental Moderno. O ocidente pode efetivamente aproveitar o pevrtido Marx,castrando-o e asociando -o a Keynes. A unica obra d Marx que dev ser preservada é o |Capital. O resto deve ser incinerado
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