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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Quando surgiram as primeiras questões sobre a necessidade de acção social actuais?

Depois de várias leituras e investigações ocasionais que fui fazendo, responderia a esta questão do seguinte modo: muito provavelmente durante os finais do séc. XVIII e por ai em diante, conhecidos que são os vários pensadores, ideologias e revoluções que surgiram e ocorreram a partir de então. Tudo isto despontado por um capitalismo selvagem que, inicialmente, com promessas de auto-regulação e criação de riqueza para todos, muito contribuiu para que no séc. XIX as sociedades ocidentais, nomeadamente as classes mais baixas, tenham atingido um estado de vivência quase sub-humano. 
Projecto New Lanark em Inglaterra - ideia de Robert Owen
 Todos nos recordados, mesmo os que apenas estudaram História até ao 9º de escolaridade - como eu -, das condições de trabalho dos primeiros trabalhadores industriais e de todas as restantes profissões ligadas às primeiras industrias. Há que recordar as 16 horas de trabalho diárias, os salários miseráveis que obrigavam pais a abandonar filhos em orfanatos, as fábricas repletas de crianças que executavam as trabalhos mais perigosos (por exemplo nas minas), os bairros de lata onde viviam pessoas amontoadas sem o mínimo de condições de saúde e higiene, e a ausência de assistência médica generalizada. Apesar de hoje, infelizmente, casos destes ainda ocorrerem, já não é a norma como foi no passado - mesmo que alguns tentem diminuir a importância do Estado Social. São desta altura as grandes epidemias associadas às péssimas condições sanitárias e de higiene, tais como a cólera e a tuberculose, entre outras.
De tudo isto resultaram reacções, muitas delas violentas (que aqui não abordarei) como seria de esperar. Vários pensadores de então analisaram os flagelos da sua época e criaram novas teorias para explicar o que se passava na sua sociedade. Alguns deles tentaram também  encontrar soluções para o presente e o futuro - o nascimento das utopias bem sociais (anarquismo, comunismo, etc.). Mas as primeiras destas ditas teorias e utopias sociais não eram somente políticas, apesar de a política ter andado sempre intrinsecamente ligada a elas, ou sendo delas como um subproduto. Através da leitura da obra «A grande história da cidade», do urbanista francês Charles Delfante, na secção dedicada ao urbanismo do séc. XIX, fica evidente o papel dos primeiros urbanistas ou industriais com consciência social na execução das novas teorias sociais. Numa época em que a desregulamentação imperava, em que o Estado, regra geral, não intervinha, nem existia o conceito generalizado de "preocupações sociais", apesar da disseminação da miséria, da ignorância e da doença entre as classes mais baixas da sociedade, foram alguns Homens mais esclarecidos - alguns filantropos - que tentaram construir e disseminar a ideia da necessidade de criar novos espaços urbanos para os trabalhadores. De lhes proporcionar condições básicas de vida, de terem habitações condignas, de terem condições sanitárias e de higiene, de terem acesso a cuidados médicos e educação e até mesmo de lazer. Alguns desses esclarecidos pensadores, que eram também pessoas com capital, elaboraram os primeiros planos e disseminaram essas primeiras ideias (muitos deles ficaram arruinados com a aplicação destes primeiros planos, um deles foi Robert Owen - os seus projectos New Lanark e New Harmony tiveram sucessos relativos mas seriam fortes influências para a posteridade), que mais tarde seriam algumas das bandeiras da "acção social". Alguns destes planos eram pura utopia, pois partiam do princípio que se poderia mudar, através do urbanismo, repentinamente toda uma sociedade segundo os ideais da partilha, do colectivismo e da fraternidade. A sociedade e o Estado teriam de evoluir para que as realizações palpáveis resultantes dessas primeiras preocupações sociais se pudessem implantar, o que foi acontecendo gradualmente ao longo dos anos, das lutas, das revoluções e à custa de cada conquista social que se ia acumulando.

Projecto New Harmony nos EUA - ideia de Robert Owen
Estes filantropos do séc. XIX deram, através da defesa dos seus modelos sociais e urbanos, contribuíram para a génese de algumas das bases ideológicas das políticas de esquerda (Comunismo, Socialismo, Social-Democracia, etc.).

(Texto publicado originalmente no blogue A Busca pela Sabedoria

autor: Micael da Silva e Sousa 

2 comentários:

  1. Um excelente artigo. Procuro para a minha dissertação de Mestrado tudo sobre o início da acção social escolar. Pretendo descobrir o início do sistema de apoio e falar com alguns dos primeiro bolseiros do Ensino Superior em Portugal. Se têm algum conteúdo útil, podem contactar-me para zedebaiao@hotmail.com

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  2. Na verdade não tenho conhecimentos aprofundados do que procura, no entanto sei que Charles Fourier dedicou algumas das suas obras à educação e à defesa dos sistemas públicos de ensino.
    No caso dos estudos universitários no estrangeiros, sabe-se que desde a formação de Portugal vários foram os Portugueses a fazer deslocações ao estrangeiros para recolher saber de modo a poderem ensinar nas universidades portuguesas.
    Lamento mas não sei ajudar mais, pelo menos assim sem investigar o assunto.

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