terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Corrupção em Portugal, a adversária da Democracia

Tanto como a consideram, Luís de Sousa e Carlos Triães (investigadores que têm dedicada parte das suas carreiras ao estudo sociológico dos fenómenos de corrupção), na obra «Corrupção e os Portugueses - práticas - atitudes - valores», a corrupção em Portugal é um fenómeno cultural associado a questões éticas - os ditos valores e práticas. Mas, ao ler-se a obra em causa, que é o resultado em livro do estudo «Corrupção e Ética em Democracia: o Caso de Portugal», podemos ir mais além e arriscar muitas outras conclusões, mais ou menos sociológicas, sobre Portugal e os Portugueses - especialmente sobre as práticas, valores, e sinergias sociais, mas também conclusões políticas.
Tentarei então, baseando-me na obra anteriormente apresentada, chegar à relação e conclusão política a que me proponho na epígrafe deste texto,  mais concretamente áquela que faz com que a corrupção seja inibidora da  concretização da Democracia e que, invocando agora alguns dos valores do socialismo democrático, impede a igualdade de oportunidades entre cidadãos. Assim, apresento aqui a corrupção como uma dos principais "inimigos" da concretização do socialismo democrático em Portugal.
Passemos então à explanação concretamente dita, utilizando alguns exemplos exemplificativos, desta suposição.
Os autores, do livro já anteriormente apresentado, afirmam que "a democracia portuguesa goza de uma cidadania informada (ainda que com grandes deficiências na qualidade, sobretudo no acesso à informação), mas politicamente pouco formada". Como sabemos, para que uma democracia - ou "Governo do Povo", do ponto de vista etimológico e ideal do termo -  se concretize, ou seja, exista de facto, os cidadãos - que são o dito Povo -, têm forçosamente de estar informados para se poderem governar (directa ou indirectamente) "bem". Significando isto que têm de ter acesso à informação e a capacidade de a usar enquanto base de saber para uma cidadania activa benéfica e consequente. Não actuar perante a corrupção - nas suas variadas formas - significa o falhanço do exercício de cidadania e um golpe de morte no sistema democrático. A Democracia não se concretiza pois as actividades de corrupção favorecem alguns (os que as praticam) em detrimento de todos os outros. Como todos os outros são o Povo, o "Governo do Povo" - A Democracia - falhou pois é o interesse do próprio Povo que não é salvaguardado.
Do ponto de vista do Socialismo Democrático enquanto doutrina, praticar corrupção é um ataque ao ideal da igualdade de oportunidades, pois ao mais simples e pequeno acto de corrupção associa-se quase sempre um favorecimento discriminatório e de efeitos negativos para a maioria.
Então, seguindo esta linha de raciocínio, que considera a corrupção como fruto da incapacidade de actuar dos próprios cidadãos, naquilo que é sua obrigação e dever, deixando-se aqui de fora o papel e responsabilidade das autoridades públicas - até porque, se pensarmos, um Estado ou Sistema de Governo (nacional ou local) existe na medida que a sua população o permite - , a génese do problema são a práticas sociais e pessoais que estão associadas a uma falta de ética e educação da generalidade dos Portugueses. Não me refiro obviamente a falta de educação do ponto de vista académico, mas sim de lacunas ao nível dos valores éticos, do sentimento de responsabilidade do indivÍduo para com a sociedade em que vive e faz parte - dos seus direitos mas especialmente dos seus deveres.
Vejamos mais algumas palavras dos autores: "Apesar da maioria dos portugueses afirmar que denunciaria às autoridades um caso de corrupção do qual tivessem conhecimento, na realidade recolhem-se ao silêncio e à indiferença". Nestas palavras saltam à vista as influências do passado  recente politico português, especialmente dos 48 anos de ditadura do Estado Novo, como esse período influenciou, na altura e ainda hoje, o modo como se lida com a denuncia e a condenação social (ou falta dela) dos portugueses face aos fenómenos da corrupção. Não é também por acaso que sociedade Portuguesa pode ser caracterizar como "Sociedade Paroquial", evidenciando-se pelo clientelismo e redes de "cunhas e favores" - característica tão antiga que antecede o próprio Estado Novo. Para Luís de Sousa e João Triães, os portugueses têm uma deficiente compreensão dos fenómenos de corrupção e não sabem definir com exactidão os limites entre as esferas públicas e privadas. São os baixos níveis de formação que expõem e fazem os portugueses enveredar por práticas de clientelismo. Esta dita "sociedade paroquial" é em tudo oposta ao modelo de sociedade democrática defendido pelo moderno socialismo moderado - o socialismo democrático -, pois impossibilita a implementação do já referido sistema de igualdade de oportunidades.
 Os autores afirmam, que associada também à baixa formação cívica e politica da população, transparece a ideia de que os portugueses têm uma visão mitológica/púdica dos seus políticos, que tendem a averiguar se os seus políticos serão pessoas como eles próprios e, invariavelmente, exigem-lhe atitudes e comportamentos éticos que os próprios não praticam. Isto é explicado também pela artificialidade com que os políticos são apresentados aos portugueses, frutos de operações de cosmética e técnicas de marketing que os tornam desumanizados. Mais uma vez é o ideal da cidadania participativa e do cidadão politico - mais um dos pressupostos do socialismo democrático -, capaz de intervir na sociedade em que se insere, não se concretiza em Portugal! Esperaria-se que numa democracia socialmente e ambientalmente responsável todos contribuírem com os melhor da suas valências. Os truques de cosmética e tratamento de imagem que sofrem os políticos profissionais, como seres artificiais e desfasados da realidade das populações, nada contribui para que seja natural o cidadãos da politica.

O problema da corrupção no nosso país não será, seguramente, devido só à falta de educação e desenvolvimento ético social e individual, é muito mais que isso e enveredar por essa única possibilidade seria, no mínimo, ingenuidade. No entanto, penso que se pode afirmar que a falta de valores éticos é responsável por parte significativa da corrupção nacional, tal como se pode dizer que a corrupção, por impedir a igualdade de oportunidades e estar relacionada com os deficientes níveis de formação e falta de participação generalizada dos cidadão na vida politica e social portuguesa, é adversária do Socialismo Democrático enquanto doutrina politica e social.

(Texto baseado noutro texto do mesmo autor, disponível em:«A corrupção e os Portugueses» – o livro que inspirou uma petição»

autor: Micael da Silva e Sousa
 

6 comentários:

  1. A nossa cultura é uma cultura com baixa responsabilidade social. Como referiam Almond e Verba - uma cultura paroquial. O Estado é visto como um inimigo, outrora representante de César, do Papa ou de uma ditadura. A história marcou-nos nesta esquizofrenia social. Basta ver como se conduz em Portugal, como se o código da estrada fosse mais um inimigo engendrado pelo arqui-inimigo Estado.
    Por outro lado, a ética, tendo perdido muito do impulso das religiões e das ideologias, passa por ser um luxo inviável para quem quer ter sucesso no mundo cão. A coisa está tão negra que as próprias empresas são forçada a dar formação em ética e a instituir comissões de ética, já que tão escassamente o meio social a promove.
    Tem muita razão o Micael, ao relacionar ética, responsabilidade e corrupção. Que podemos fazer? Participar na gestão da nossa sociedade - associações, partidos, petições, etc. Os bodes expiatórios dos nossos males não devem ser os políticos, nem os funcionários públicos, nem o grande capital internacional, nem os media nem seja quem for, por mais que ganhe ou perca com a degradação das sociedades ocidentais. O responsável é a nossa mania de criticar sem nada propor e sem nada fazer por isso.

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  2. A nossa cultura é uma cultura com baixa responsabilidade social. Como referiam Almond e Verba - uma cultura paroquial. O Estado é visto como um inimigo, outrora representante de César, do Papa ou de uma ditadura. A história marcou-nos nesta esquizofrenia social. Basta ver como se conduz em Portugal, como se o código da estrada fosse mais um inimigo engendrado pelo arqui-inimigo Estado.
    Por outro lado, a ética, tendo perdido muito do impulso das religiões e das ideologias, passa por ser um luxo inviável para quem quer ter sucesso no mundo cão. A coisa está tão negra que as próprias empresas são forçada a dar formação em ética e a instituir comissões de ética, já que tão escassamente o meio social a promove.
    Tem muita razão o Micael, ao relacionar ética, responsabilidade e corrupção. Que podemos fazer? Participar na gestão da nossa sociedade - associações, partidos, petições, etc. Os bodes expiatórios dos nossos males não devem ser os políticos, nem os funcionários públicos, nem o grande capital internacional, nem os media nem seja quem for, por mais que ganhe ou perca com a degradação das sociedades ocidentais. O responsável é a nossa mania de criticar sem nada propor e sem nada fazer por isso.

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  3. Caro comentador, agradecemos imenso o seu comentário e está disponível o modo anónimo como forma de comentar, mas se possível pedimos sempre sempre para as pessoas se identificarem, nem que seja com o seu nome no final das suas palavras. Não por se querer aqui apontar o dedo a alguém, simplesmente porque se torna mais fácil depois fomentar o debate. No entanto que pretenda continuar a usar o anonimato está sempre no seu direito.

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  4. Concordo perfeitamente com o que se diz no anterior comentário. Efectivamente os cidadãos, que muitas vezes são simplesmente apelidados de "portugueses" não se revêm no Estado. Por razões óbvias e até etimológicas os malefícios que isto provocam no sistema democrático são evidentes. Continuo a defender que isto só se consegue alterar com mais educação cívica e para a cidadania activa, sendo cada um a reflectir sobre as suas acções e inacções na nossa sociedade.

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  5. Micael... pediram-me para divulgar isto, mas como o meu blogue não se presta a este tipo de posts, acho que aqui neste seu post, encaixa perfeitamente e como concordo plenamente... Obrigada.

    "Os colaboracionistas vão formar governo

    Em Colapso, Jared Diamond passou em revista civilizações extintas, da Roma Imperial à ilha da Páscoa ou às civilizações meso-americanas. Procurou os motivos comuns dessa implosão. Um dos motivos é a incapacidade de mudança das elites dirigentes. As sociedades parecem viver a dois tempos. Um tempo que já não existe infiltra as pessoas comuns. E é um tempo de desistência e desinteresse, onde os homens, nas praças, continuam a partida de xadrez ou da pelota basca. Nesta praça, na tarde de sexta-feira, juntam-se desempregados de longo curso, mulheres sem reputação, uma ou outra criança, reformados. Jogam a petanca. As televisões vomitam notícias de desgraça. O país não tem dinheiro. Os empréstimos vão ser negociados pelos culpados da crise e os que a crise não atingiu, em seu sustento e benefício. O Estado da modernidade acabou e vem aí, impiedoso, o Estado hiper moderno degenerado, duro com os contribuintes, ignorando os pobres, tolerante para os aldrabões, protector dos bancos. Nobre era afinal um Cavaco para os pobres de espírito, sempre prontos para acreditar em fadas e duendes. Os apoiantes do partido de Sócrates entram em delírio litúrgico. A realidade é mais suportável quando vivida no fanatismo das seitas. Os Vitorinos impantes de hoje serão os primeiros a felicitar democraticamente os vencedores das próximas eleições e a desertar para os negócios obscuros. Os oficiantes da classe média exultam: Barreto , Medina Carreira, Silva Lopes, o Miguel, nunca tiveram tanta solicitação. Os aviões da Nato continuam a bombardear humanitariamente a Líbia enquanto Kadafi dá entrevistas à BBC. Um sentimento de irrealidade parece comum à gente que, indiferente aos sinais, continua a fazer a vida de todos os dias, nas cidades da Europa, enquanto no Japão se contam os mortos. Depois da carga da aviação das agências de rating, os funcionários da U E avançam implacáveis sobre os destroços dos países que se renderam. Primeiro tomaram Atenas, depois Dublin. Em Lisboa, os colaboracionistas preparam-se para formar um governo nacional.
    Na praça, indiferentes, os que vão morrer atiram bolas de chumbo contra o Jack. Com o maquis queimado e a juventude anestesiada pela Primavera, não há ninguém para a resistência."

    Foi retirado daqui

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  6. Portugal

    Num pequeno pedaço de terra banhada pelo Mar, nasceu um dia um Belo Jardim Florido com todas as Cores do Arco Ires.
    Jardim esse que levou Vários Séculos a ser Construído, desde então cuidado e reparado ao logo da sua Existência por Vários Jardineiros.
    Mas nem todos são Iguais, com mais ou menos água ou adubo, ele tem sofrido (o Jardim) alterações nos últimos Anos.
    Durante mais ou menos 50 Anos foi regado poucas vezes e de vez em quando lá era destapado para entrar um pouco de Sol, as Flores, essas, começaram a perder a sua Cor e Brilho Natural.
    De repente tudo voltou a mudar, alguém se lembrou de substituir novamente o Jardineiro, pois este já não era Bom, daí nasceu a escola de Jardinagem que todos Conhecem Hoje.
    Ao longo dos últimos 30 Anos, com tamanha Agitação, Dedicação e Confusão, Vinda da escola de Jardinagem, tudo Voltou a perder a sua Cor e Brilho Natural.
    Problema dos problemas, no Mundo de Hoje não ter Jardineiros que saibam ver qual é o problema!
    Abriram um concurso Internacional ao que se paga milhões, para tentar salvar essas Flores que, se encontrão em Vias de extinção.

    J.B.

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